Jacó Armínio

Jacó Armínio

Houve uma época em que a tradição nazarena e wesleyana-de santidade era comumente chamada de tradição wesleyana-arminiana, como em Mildred Bangs Wynkoop's Fundamentos da Teologia Armínio-Wesleyana (2004, Casa Nazarena de Publicações, Campinas, SP). Em muitos círculos nazarenos e de santidade, a metade wesleyana do nome é certamente mais bem conhecida, porém, por algum motivo, a parte arminiana foi deixada de lado. Mas quando John Wesley começou a publicar sua própria revista, ele a chamou de O Arminiano. Quem, então, foi Armínio e qual foi seu legado entre as igrejas que ele influenciou, direta ou indiretamente?

Jacob Harmenszoon (1559–1609), ou Jacó Armínio,[1] foi um teólogo holandês ativo na parte inicial da pós-reforma. Ele foi educado em teologia reformada em Leiden, Marburg, Basileia e Genebra, onde foi um aluno do sucessor de João Calvino, Theodore Beza. Após seu treinamento teológico, ele foi ministro na Oude Kerk (Igreja Velha) em Amsterdã por 15 anos. Ele então passou os seis últimos anos de sua vida como professor na faculdade de teologia da Universidade de Leiden.

Armínio é mais conhecido por sua oposição a alguns aspectos da teologia reformada, especialmente as doutrinas reformadas ou calvinistas de predestinação incondicional e graça irresistível. Contra a visão reformada predominante, Armínio ensinou que Deus dá a todos a graça que é resistível e ele elege crentes - isto é, as pessoas que não recusam a graça salvadora e a fé de Deus. Embora o pensamento e os escritos de Armínio tenham sido prolíficos e abrangentes, ele é mais lembrado por seus ensinamentos sobre esses assuntos controversos relacionados à predestinação e graça.

O pensamento de Armínio foi profundamente influente entre os protestantes não-calvinistas e anti-calvinistas, dos protestantes holandeses aos metodistas wesleyanos até o Segundo Grande Despertar americano e o pentecostalismo global. Aqui eu expandirei três pontos sobre sua teologia que moldaram todas essas trajetórias do pensamento e prática cristãs.[2] 

1. Amor divino pela criação. Deus criou e ama todas as pessoas com o propósito da salvação. 

Primeiro de tudo, Armínio enfatiza a teologia da criação. Armínio enfatiza que o ato de criação de Deus é a comunicação do bem apenas, destinada ao bem da criatura. O ato de criar foi a primeira demonstração da graça livre de Deus. Os colegas reformados de Armínio não poderiam expressar o propósito de Deus com tanta clareza. Em alguns relatos reformados, uma grande parte da humanidade foi criada com o propósito de destruição. Mas para Armínio, o desejo de Deus pela salvação de "todos os povos" (1 Timóteo 2:4) significa cada pessoa individual. Além disso, ao dar liberdade à criação, Deus limita suas ações em relação à criação. Armínio enfatizaria a autolimitação divina em relação à criação.

2. Eleição condicional. Deus elege (escolhe) para salvar os crentes.

A condição de salvação é a fé penitente e a condição de condenação é a incredulidade impenitente. A diferença entre eleição incondicional e condicional pode ser resumida com esta pergunta: você acredita porque é eleito (reformado) ou você é eleito porque acredita (arminiano)?

3. Graça resistível. A salvação é somente pela graça, mas os humanos podem resistir ao Espírito Santo.

Armínio acreditava que a graça que é necessária para a salvação pode ser recusada. A fé salvadora é um presente de Deus. A graça é necessária a cada passo do caminho. Para os reformados, Deus sempre alcança quem ele elege, mas seu amor salvador é seletivo. Para Armínio, Deus pode não alcançar todos que ele quer, mas seu amor salvador é universal. Para Armínio, a salvação, da perspectiva humana, é basicamente a recusa em resistir à graça de Deus.

Há muitos aspectos do legado de Armínio que resistiram através dos séculos, e alguns temas fundamentais são compartilhados por quase todas as comunidades e teólogos arminianos ou de inclinação arminiana. Esses pontos não foram inventados por Armínio; suas raízes são profundas na história do pensamento cristão. Os tópicos em si não são peculiares ao arminianismo. Em vez disso, a interpretação e a ênfase que eles recebem os fazem se destacar como arminianos. Pelo menos na teologia protestante, esses elementos se combinam para formar uma tradição teológica distinta - seja na trajetória protestante liberal (por exemplo, protestantes e algumas partes da Igreja Anglicana e da UMC) ou na trajetória de expressões wesleyanas e evangélicas mais conservadoras (tradições de santidade, incluindo nazarenos).

1) Bondade de Deus

Os arminianos sempre enfatizaram a bondade como um dos atributos fundamentais de Deus. Se, como a teologia reformada parece indicar, Deus decretou a queda da humanidade de tal maneira que não foi possível que ela não ocorresse, se ele criou seres humanos individuais a quem ele nunca concederá a graça salvadora (embora ele pudesse se ele quisesse), e se ele criou réprobos para que eles pecassem e assim fossem eternamente destruídos, então parece aos arminianos que Deus é diretamente culpado pelo mal. Para Armínio, porque Deus é a fonte de todo o bem, o ato de criação de Deus é a comunicação do bem apenas e é destinado ao bem da criatura. De acordo com Armínio, apegar-se a uma visão adequada da bondade de Deus é necessário para uma teologia sólida.

2) Graça Divina e Liberdade Humana

Como um corolário da ênfase arminiana na bondade de Deus, os arminianos também afirmam a compatibilidade entre a graça divina e a liberdade humana. Para os arminianos, a liberdade humana não ameaça a soberania de Deus. Em assuntos pertencentes à salvação, os seres humanos retêm a liberdade de receber ou resistir à graça que leva à fé salvadora. Os arminianos, como os wesleyanos, afirmam a liberdade de escolha em geral e em relação à salvação. A graça e a liberdade andam de mãos dadas, mas os arminianos estão muito mais interessados em proteger a soberania e a prioridade da graça do que em exaltar uma liberdade humana supostamente autônoma. 

3) Santificação e Boas Obras

Outra característica do arminianismo é sua ênfase distinta na santificação e a necessidade de continuar em boas obras de fé e amor. Para Armínio, a "justiça original" que foi perdida na queda em pecado é substituída no regenerado com uma justiça renovada. A santificação é o que Deus opera em Seu povo, tornando-o santo e justo. Para John Wesley, o objetivo desse crescimento é a inteira santificação ou perfeição cristã. Mais tarde, os wesleyanos concordam que as boas obras inevitavelmente seguem a regeneração. Essa ênfase em boas obras, é claro, implica não apenas a necessidade de evitarmos o pecado, mas também a vitória sobre ele mediante a ação e o auxílio do Espírito Santo de Deus.”

4) Tolerância e Ecumenismo

Os grupos arminianos muitas vezes estiveram na vanguarda da tolerância religiosa e do ecumenismo cristão. Teologicamente, a vontade salvífica de Deus é universal em escopo, por isso o reconhecimento da verdade em outras denominações e outras religiões tende à inclusão. Sociologicamente, os grupos arminianos, na medida em que surgiram em contextos dominados pela teologia reformada, muitas vezes receberam a marginalização e perseguição, uma circunstância que os faz pensar mais profundamente e defender a tolerância. O movimento wesleyano começou com uma ênfase na tolerância, o que o próprio Wesley chamou de um "espírito católico". John Wesley pregou o amor e o respeito por outros cristãos. 

Como um pastor e teólogo, Armínio foi o destinatário de uma longa e venerável tradição cristã, e ele aplicou essa sabedoria antiga a novas situações. Que possamos trabalhar para fazer o mesmo. A ênfase de Armínio na graça que coopera com o livre-arbítrio humano, sua doutrina da providência, sua insistência no amor santo de Deus por toda a criação e seu desejo de voltar ao básico do cristianismo como um fundamento da unidade cristã - essas são todas as mensagens que ainda precisamos hoje. 

Keith Stanglin é diretor executivo do Centro de Estudos Cristãos; Professor de Teologia Histórica, Harding School of Theology; Ministro da University Avenue Church of Christ em Asbury, Kentucky.

 

[1] A erudição anglófona mais antiga sobre Armínio seguiu a longa tradição de traduzir Jacó como "Tiago".

[2] Para mais sobre a biografia de Armínio, os seguintes pontos sobre sua teologia e legado e sua influência na história subsequente da teologia, veja Keith D. Stanglin e Thomas H. McCall, Jacob Arminius: Theologian of Grace (New York: Oxford University Press, 2012); e Thomas H. McCall e Keith D. Stanglin, After Arminius: A Historical Introduction to Arminian Theology (New York: Oxford University Press, 2021).

Public

Similar news

Out, 24, 2025
Out, 24, 2025
Out, 24, 2025