À Beira de Tudo

À Beira de Tudo

A frase “À Beira de Tudo” foi tirada de um livro de Parker Palmer recentemente publicado.[1] O Dr. Palmer é um educador, escritor e pensador renomado. Ele fez 80 anos há pouco tempo e, em seu livro, ele olha para trás, para a paisagem de sua vida. De fato, o subtítulo do livro é “Graça, Gravidade & Envelhecimento”. 

Entretanto, embora ele olhe para trás, seu foco é para frente—como se a gravidade estivesse puxando-o para o futuro ao invés de segurando-o para trás. O Dr. Palmer encerra o prelúdio do livro com essa frase: “Bem-vindo à beira de tudo. É preciso uma vida inteira para chegar aqui, mas a vista deslumbrante e a brisa no seu rosto fazem a viagem valer a pena”.[2]

Pode parecer um pouco contra-intuitivo, mas é exatamente aqui que devemos nos encontrar hoje como denominação. Não importam as circunstâncias, a igreja deveria manter seu foco para frente. Temos uma história histórica e rica. Abraçamos e promovemos nossas valiosas tradições e honramos aqueles com longos anos de serviço – mas nosso olhar deve estar fixo no horizonte, no que pode ser e não no que foi. 

Mesmo agora, nesse momento na nossa história, deveríamos estar na pontinha dos pés, apertando nossos rostos no vidro e perguntando . . . E agora? O que vem a seguir? E se? Por que não?

O Dicionário Cambridge, em inglês, explica o termo “beira” como "à beira de um penhasco ou outra área alta, ou o ponto em que algo bom ou ruim vai acontecer", seguido deste exemplo, "A empresa estava à beira do colapso".[3]

Eu não tenho certeza se o termo “beira” geralmente carrega uma conotação negativa—como “à beira de um colapso”, ao invés de sugerir que podemos estar à beira de algo maravilhoso, algo empolgante, desafiador e preenchedor. Certamente, como cristãos, temos que ser homens e mulheres de fé que servem a Deus que é capaz de fazer infinitamente mais do que tudo o que podemos pedir ou imaginar; o Deus que declarou: “Eis que estou fazendo algo novo” (Efésios 3:20; Isaías 43:19).

Há momentos difíceis com desafios na vida e na vida da igreja, mas temos que ser (e podemos ser!) mais do que vencedores (Romanos 8:37).

Bom Dia

Eu penso na saudação que o Dr. Phineas F. Bresee, um dos fundadores da Igreja do Nazareno, gostava tanto de usar. Independente da hora do dia, o Dr. Bresee diria: “Bom dia!” e depois acrescentava: “É sempre dia na Igreja do Nazareno”.[4] Até quando ele estava perto do fim de sua vida, ele firmemente acreditava que ele e o movimento que ele fundou estavam à beira de algo grandioso. 

O Dr. Bresee estava muito enfermo quando ele deixou sua casa na Califórnia para participar e presidir a Assembleia Geral de 1915 em Kansas City. Os que acompanharam Bresee na longa viagem incluíam sua esposa, Maria; a filha deles, Sue; a nora, Ada; e um grupo distinto de colegas incluindo Seth Rees, Tio Buddy Robinson, e um jovem H. Orton Wiley, que, na época, era presidente do que agora chamamos de Point Loma Nazarene University.

Era evidente para a família que o Dr. Bresee estava gravemente doente. Quando eles chegaram em Kansas City, Ada ligou para seu esposo, o Dr. Paul Bresee, para vir rápido e atender seu pai. Numa carta para amigas próximas, a Sra. Bresee confidenciou:

Ele estava bem ansioso para estar na Assembleia e ele certamente trabalhou e planejou que seria uma ajuntamento abençoado. . . Ele recebeu força para aquela reunião, embora, para qualquer outra pessoa, teria estado fora de questão pensar ser possível estar lá. Mas seu amor pelo trabalho, sua energia, sua força de vontade para fazer– os impulsionavam para prosseguir, quando todos sentimos que ele não conseguiria sair de seu quarto . . . Mas quando ele sentou à mesa para presidir, ele parecia tão forte, que ninguém percebeu que ele estava tão doente, tão perto do lar celestial.[5]

O Dr. Bresee escreveu e apresentou o relatório dos superintendentes gerais na Assembleia Geral de 1915. Naquela época, os superintendentes gerais eram o Dr. Bresee, o Rev. Hiram F. Reynolds e o Dr. E. F. Walker. 

Eu gostaria de poder passar com você linha por linha do relatório do Dr. Bresee—seu último relatório para a igreja que ele amava. Isso não é possível no contexto desse breve artigo, mas eu compartilharei algumas linhas para destacar seu otimismo e entusiasmo pelo futuro. 

Ele  começou dizendo: “Quatro anos se passaram desde a última Assembleia Geral em Nashville, Tennessee. Esses têm sido anos agitados. Uma igreja tão nova quanto essa faz história rápido . . .”[6]

Ao continuar, ele repetidamente falou de progresso, crescimento e oportunidade. Eu anotei particularmente a seção de seu relatório que fazia referência a educação superior nazarena, que, é claro, estava em sua infância naquela época. Ele deu conselhos sábios por toda aquela seção, dizendo: “Educação superior é de natureza tal que a igreja que coloca esse trabalho na mão do Estado ou de outros, rapidamente se encontrará roubada de sua melhor herança . . . Academias e faculdades são, para nós, uma necessidade”.[7]

Então, ao encerrar seu relatório, o Dr. Bresee disse:

Deus tem nos colocado num lugar de grande responsabilidade. Somos representantes e guardiões de [um fundo sagrado] . . . Uma compreensão do grande trabalho para o qual Deus nos chamou, nos maravilhará em reverência e nos impulsionará a buscar a unidade mais próxima com Deus e uns com os outros, para que possamos nos mostrar dignos de nosso alto chamado. Mais e mais devemos perceber que (este trabalho) não é de homem, mas de Deus. Proximidade com o Todo-Poderoso é a nossa esperança de vitória.

Temos escrito o Nome adorável na nossa bandeira e temos levantado-o ao olhar dos homens. Alguns estão olhando para nós com esperança, não vamos decepcioná-los. Não vamos vacilar. Vamos ser verdadeiros. À diante – com os olhos firmemente fixados no Mestre.[8]

Até no final de sua vida, seu foco era para frente. Ainda era dia. O sol estava nascendo e havia um futuro brilhante adiante.

O Dr. Bresee morreu poucas semanas depois, cercado por sua família. Seu falecimento é descrito com mais detalhes nas páginas finais do Phineas F. Bresee: A Prince in Israel, A biografia do Rev. E. A. Girvin’s sobre o Dr. Bresee. Girvin escreveu:

Para mim, foi um privilégio ver muito do Dr. Bresee durante os vinte e nove dias que transcorreram entre seu retorno da Assembléia Geral e sua morte. Seus últimos dias foram coroados com vitória completa. Ele faleceu à uma hora do sábado à tarde, 13 de novembro de 1915, amado e lamentado por uma vasta multidão daqueles que foram ajudados por seu ministério e abençoaram sua vida. Por fim, as mãos ocupadas estavam quietas; a voz clarividente silenciosa. No momento de sua morte, ele estava no auge de sua capacidade intelectual e espiritual. Ele era uma alma real, um verdadeiro cristão, um homem nobre, um marido amoroso, um pai afetuoso, um amigo fiel, um verdadeiro irmão no Senhor. Ele nos deixou com corações tristes e olhos lacrimejantes, mas com uma viva esperança de encontrá-lo onde estão as muitas mansões.[9]

E. A. Girvin não registrou as últimas palavras do Dr. Bresee. Talvez elas tenham se perdido para sempre. Entretanto, talvez, só talvez, suas últimas palavras tenham sido: “Bom dia”, pois certamente ele morreu como ele viveu—“à beira de tudo”—sempre olhando para frente com fé e confiança.

John Bowling é ex-presidente da Olivet Nazarene University em Bourbonnais, Illinois, EUA.

Holiness Today, Março/Abril de 2021

 

1. Parker Palmer, On the Brink of Everything – Grace, Gravity & Getting Old (Oakland, California: Berrett-Koehler Publishers, Inc, 2018)

2. Palmer, On the Brink of Everything, 10.

3. Cambridge Dictionary, “Brink” (http:/tinyurl.com/y8npy22z). Tradução livre.

4. Timothy Smith, na introdução de The Certainties of Faith (Kansas City: Nazarene Publishing House, 1958).

5. Carl Bangs, Phineas Bresee (Kansas City: Beacon Hill Press, 1995) 277.

6. E. A. Girvin, Phineas F. Bresee: A Prince in Israel (Kansas City: Nazarene Publishing House, 1916. Reprinted in 1981), 445.

7. Girvin, 450.

8. Girvin, 451-452.

9. Girvin, 456.

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